24/09/2010

Miscelânea de Clarice

escrever

"Sou uma iniciada sem seita.”

(In: “Água Viva”)

“Por outro lado, estou hoje um pouco cansada e é sobre o prazer do cansaço dolorido que vou falar. Todo prazer intenso toca no limiar da dor. Isso é bom. O sono, quando vem, é como um leve desmaio, um desmaio de amor. Morrer deve ser assim: por algum motivo estar-se tão cansado que só o sono da morte compensa. Morrer às vezes parece um egoísmo. Mas quem morre às vezes precisa muito. Será que morrer é o último prazer terreno?”

(In: “A Descoberta do Mundo”)

“Essa incapacidade de atingir, de entender, é que faz com que eu, por instinto de... de quê? Procure um modo de falar que me leve mais depressa ao entendimento. Esse modo, esse "estilo" (!), já foi chamado de várias coisas, mas não do que realmente e apenas é: uma procura humilde.

Nunca tive um só problema de expressão, meu problema é muito mais grave: é o de concepção. Quando falo em "humildade" refiro-me à humildade no sentido cristão (como ideal a poder ser alcançado ou não); refiro-me à humildade que vem da plena consciência de se ser realmente incapaz. E refiro-me à humildade como técnica.

Virgem Maria, até eu mesma me assustei com minha falta de pudor; mas é que não é. Humildade com técnica é o seguinte: só se aproximando com humildade da coisa é que ela não escapa totalmente.

Descobri este tipo de humildade, o que não deixa de ser uma forma engraçada de orgulho. Orgulho não é pecado, pelo menos não grave: orgulho é coisa infantil em que se cai como se cai em gulodice. Só que orgulho tem a enorme desvantagem de ser um erro grave, com todo o atraso que erro dá à vida, faz perder muito tempo.”

(In: "A Descoberta do Mundo")

“Sua sensibilidade incomodava sem ser dolorosa, como uma unha quebradiça."

(In: Laços de Família)

“Coisas que aprendi”... Você não acha que cada uma de nós poderia escrever pelo menos um folhetozinho, se não um livro (as felizardas), sobre as coisas que foi aprendendo na vida?

O que é que você aprendeu, por exemplo? Em aprender, vale tudo. Eu, por mim, não aprendi muito – e isso é porque valorizo cada fiapo de ensinamento que os dias foram me dando. E valorizo sobretudo o que aprendi à minha própria custa. Não é por vaidade, acho que é porque doeu mais aprender desse modo, custou mais caro q a gente esquece menos.
Que é que você aprendeu, por exemplo, a respeito de conselho? Quero dizer dar conselhos?
Aprendi que ouvir quem tem um problema é quase mais importante do que aconselhar. Enquanto a pessoa vai falando – e sabendo que alguém ouve realmente – ela própria vai se esclarecendo. Sem falar que desabafa também.
Outra cosia que aprendi sobre o mesmo assunto, se você disser à pessoa que ela está “completamente errada”, você a coloca na mesma hora na defensiva, o que também significa “disposição de não aceitar”. E você que está com a melhor boa vontade do mundo em querer ajudar só consegue é criar uma infeliz animosidade.
Conheço uma pessoa que descobriu um jeito muito bom de “contrariar”. Depois que ouve o maior absurdo responde pensativamente: “É, sim. Mas por outro lado... etc.” e então diz com suavidade o que realmente lhe parece.
( In: Correio Feminino)

POSTADO POR PRI SGANZERLA ÀS 10:55

http://fragmentosalheios.blogspot.com/2008/12/miscelnea-de-clarice.html

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